DOCUMENTO CONSEA À PRESIDENTA DILMA SOBRE CLIMATE SMART AGRICULTURE

Excelentíssima Senhora Presidenta da República,

O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA), reunido na sua
XV Reunião Plenária no dia 05 de agosto de 2014, discutiu e aprovou propostas
relativas às negociações de mudanças climáticas, em especial das questões relacionadas
à agricultura, no âmbito da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças
Climáticas (UNFCCC), tendo em vista a realização da Cúpula das Nações Unidas sobre
Clima (United Nations Climate Summit), convocada pelo Secretário-Geral das Nações
Unidas Ban Ki-moon, em Nova Iorque, em 23 de setembro, e da Conferência das Partes
(COP) 20, que será realizada em Lima, Peru, de 01 a 12 de dezembro de 2014.
No ano de 2010, começou a ser desenvolvido por um grupo de países apoiados pela
Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), em parceria
com o Banco Mundial, o conceito de agricultura inteligente em termos climáticos
(Climate Smart Agriculture – CSA). A definição seria uma agricultura “sustentável que
aumenta a produtividade, resiliência (adaptação), reduz e elimina gases de efeito estufa
(mitigação), e aumenta a concretização dos objetivos de segurança alimentar nacional e
de desenvolvimento”. Assim, o conceito de CSA está baseado no chamado “ganho
triplo” (triple win): mitigação por meio do sequestro de carbono e não da redução das
emissões, adaptação e aumento da produtividade, com foco nos países em
desenvolvimento.
Em paralelo, o tema da agricultura foi surgindo com mais força nas negociações
internacionais no âmbito da UNFCCC, especialmente a partir de 2008, com o
lançamento de documento técnico sobre os desafios e oportunidades para mitigação no
setor agrícola, seguido de oficina sobre o tema, realizada em 2009. A partir daí, foi
criado grupo informal que prepararia texto solicitando a criação de programa de
trabalho de agricultura no âmbito do Órgão Subsidiário de Assessoramento Científico e
Tecnológico (SBSTA) da Convenção. Assim, em 2012, o tema entrou com mais força
nas negociações, embora existam muitas divergências entre os países membros se a
CSA deveria ser inserida no âmbito da mitigação ou da adaptação. A questão da CSA
ainda não é considerada como tal nas negociações, apesar da pressão de diversos países
desenvolvidos e de organizações internacionais para que o mecanismo seja estabelecido.
A construção de alianças e parcerias para a CSA terá seu momento crucial no próximo
dia 23 de setembro de 2014, quando será lançada a Aliança Global para a Agricultura
Inteligente em Termos Climáticos (GACSA) em Nova Iorque durante a Cúpula das
Nações Unidas sobre Clima (UN Climate Summit). A Aliança, que é apoiada pelos 2
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Estados Unidos e Holanda, e por muitas empresas transnacionais da cadeia agrícola
mundial, visa integrar a CSA para o financiamento de pesquisa junto a ajudas bilaterais
e multilaterais, e fontes de financiamento privada; promover metodologias para criação
de métricas para avaliar os gases de efeito estufa (GEE) das reduções de emissões em
nível de escala de paisagem (landscape scale); desenvolver um conjunto de resultados
quantitativos (indicadores) para 2030 nos três pilares da CSA.
O CONSEA, em 28 de outubro de 2009, quando da publicação da Exposição de
Motivos nº 008 sobre Mudanças Climáticas e seus impactos no Direito Humano à
Alimentação, na Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, manifestou sua
“expectativa quanto ao papel que pode ser desempenhado pelo Brasil,
internacionalmente, na perspectiva de uma inserção diferenciada e proativa que coloque
ênfase na erradicação da fome e na promoção da soberania e segurança alimentar e
nutricional e no direito humano à alimentação adequada e saudável”.
Considerando o exposto, o CONSEA aprovou as seguintes recomendações:
1. O Governo Brasileiro deve acompanhar com atenção o lançamento da Aliança
Global para a Agricultura Inteligente em termos Climáticos (Climate-Smart
Agriculture), em especial seus desdobramentos em termos de pressões para que
mais mecanismos de mercado, revestidos de propostas aparentemente positivas,
façam com que as responsabilidades históricas dos países desenvolvidos sejam
substituídas pelo foco em ações dos países em desenvolvimento como os únicos
responsáveis pela redução das emissões do setor agrícola.
2. Reafirmar a UNFCCC como o fórum multilateral legítimo para negociar a
criação de metodologias de medição para redução dos gases de efeito estufa.
3. Apoiar a posição dos negociadores brasileiros no sentido de que o tema da
agricultura e seu financiamento seja tratado relacionado com as negociações
climáticas em adaptação, sem vincular ações de mitigação na agricultura com o
financiamento, favorecendo deste modo que os países menos desenvolvidos
confiram prioridade às medidas de adaptação e à segurança alimentar e
nutricional, enfrentando as ameaças reais à produção de alimentos.
4. Reafirmar a defesa de que o Brasil desempenhe “papel ativo, assertivo e de
liderança nas negociações internacionais na defesa de uma agenda que promova
o direito humano a alimentação adequada e a segurança alimentar e nutricional
das populações em situação de pobreza no mundo mais vulneráveis à
variabilidade [e às mudanças] climática[s]”, conforme mencionado na E.M. nº
008/2009 do CONSEA.
5. Por oportuno, insistir sobre a importância de conferir visibilidade às
experiências brasileiras orientadas pela agroecologia que constituem respostas
efetivas ao fenômeno das mudanças climáticas nos aspectos da mitigação e da
adaptação.

Respeitosamente,
Maria Emília Lisboa Pacheco
Presidenta do CONSEA

Brasília, 08 de agosto de 2014