Precificação do carbono emerge de forma diversa ao redor do mundo

07/06/2013   –   Autor: Fernanda B. Muller   –   Fonte: Instituto CarbonoBrasil

Acompanhando as iniciativas de controle das emissões de gases do efeito estufa, o Banco Mundial divulga um relatório enfatizando a diversidade de novas abordagens e pontuando o cenário para os mercados de carbono, incluindo o MDL

 

Apesar dos problemas enfrentados pelo esquema europeu de comércio de emissões (EU ETS) e de a perspectiva de uma abordagem global para a precificação do carbono estar longe, novas iniciativas estão evoluindo mais rápido que nunca, é o que aponta um novo relatório do Banco Mundial.

Foram identificados mais de 40 países e 20 jurisdições subnacionais que já implementaram ou estão considerando colocar um preço sobre o carbono, aprendendo com as experiências passadas e desenvolvendo novos elementos.

A quantidade de iniciativas, variando de esquemas de comércio de emissões a taxas sobre o carbono, mostra a importância que os legisladores dão à precificação como uma forma de lidar com as mudanças climáticas, destaca o Banco Mundial.

“É o avanço em nível de país que nos dá esperança – a inovação, energia e sagacidade dentre as pessoas desenvolvendo esses sistemas nacionais e subnacionais é que nos convence de que a precificação e os mercados de carbono têm um futuro”, comentou Rachel Kyte, vice-presidente para desenvolvimento sustentável do Banco Mundial.

Segundo a publicação, os países que atualmente já têm seus esquemas implementados ou agendados emitem o equivalente a cerca de dez gigatoneladas de dióxido de carbono (CO2) ao ano – aproximadamente as emissões de Estados Unidos e União Europeia combinadas –, ou 20% do total global.

“Se a China, Brasil, Chile e outras economias emergentes que consideram esses mecanismos forem incluídas, as iniciativas de precificação do carbono podem abranger países que emitem 24 GtCO2e por ano, ou quase a metade do total”, disse Niklas Höhne, diretor de energia e políticas climáticas da empresa Ecofys e principal autor do relatório.

Conexões entre os esquemas são importantes para o ganho de eficiência, e tais acordos estão evoluindo em esquemas como o EU ETS e o mecanismo australiano, além do sistema da Califórnia e Quebec.

Diversidade

Alexandre Kossoy, especialista financeiro sênior do Banco Mundial e coordenador do relatório, aponta que há diversas formas de precificar o carbono sendo adotadas, desde os esquemas de comércio de emissões e mecanismos de criação de créditos (crediting mechanisms – estipulados para um determinado setor econômico de um país) até impostos diretos (carbon tax).

“Pode não existir um ‘tamanho único’, mas está claro que as bases da primeira geração de instrumentos de mercado estão formando o que constituirá o cenário futuro da precificação do carbono”, comentou Kossoy.

Várias atividades envolvendo novos mecanismos de mercado estão ocorrendo dentro da Parceria para a Preparação dos Mercados (PMR, em inglês), como as NAMAs (Ação Nacional Apropriada de Mitigação) do México, Colômbia, Vietnã e Indonésia, mostra o relatório. A Costa Rica, membro do PMR, tem como meta ser neutra em carbono até 2012.

As NAMAs, definidas no Plano de Ação de Bali (2007), também têm chamado atenção. Muitos países têm desenvolvido e relatado as suas NAMAs – informações oficiais disponíveis em www.namapipeline.org –, um elemento voluntário firme cada vez mais importante na política climática internacional, coloca o banco. As ações variam desde projetos específicos até políticas setoriais.

Por enquanto, as NAMAs podem ser financiadas por recursos domésticos ou apoiadas por recursos estrangeiros. Porém, há discussões – com opiniões diversas – sobre o que seria um sistema de “NAMAs creditadas”, unido com novos mecanismos de mercado.

Outro exemplo de iniciativa é a parceira NOAK-NEFCO, que está apoiando atividades no segmento de resíduos sólidos no Peru e no setor de cimento no Vietnã.

Taxas sobre a tonelada de carbono emitida já foram implementadas na Austrália, Japão, Dinamarca, Finlândia, Suécia, Irlanda, Noruega, Colúmbia Britânica (Canadá) e Suíça. O Reino Unido está iniciando a aplicação da taxa em 2013 e a África do Sul tem planos para 2015.

Os países podem usar as taxas sobre o carbono como um instrumento único, ou para complementar outras medidas, como os mercados de emissões, coloca o relatório.

Levando em conta o exemplo dos países escandinavos, onde a taxa está em vigor desde o início da década de 1990, a publicação sugere que há evidências de que esse método resulta em reduções de emissão abaixo do usual (business as usual).

Com a variação na forma geral dos esquemas que lidam com as emissões, aparecem também formas diversas de resolver questões específicas que vem se provando desafios na materialização da precificação do carbono.

Por exemplo, o mecanismo australiano inclui uma abordagem de determinação das metas que pode ser ajustada a novas condições econômicas e ambientais. No Reino Unido, o piso para o preço do carbono visa suplementar os atuais valores baixos do EU ETS, auxiliando o país a caminhar para a sua meta de cortar em 80% as emissões até 2050.

Os esquemas da Califórnia, Quebec e Iniciativa Regional de Gases do Efeito Estufa (RGGI) incluem salvaguardas de contenção de custos caso os valores do carbono sejam altos demais. Vários sistemas permitem o uso de compensações de emissão para conter os preços.

O relatório alerta que já que os detalhes dos novos mecanismos de mercado ainda estão sendo definidos, potenciais sobreposições com outros mecanismos, como o MDL e as NAMAs, precisam ser avaliadas.

O mercado atual

A incerteza em torno do futuro do mercado de carbono na União Europeia (UE) tem evitado que recursos valiosos sejam canalizados para investimentos de baixo carbono, especialmente do setor privado, lamenta o relatório.

O valor das Reduções Certificadas de Emissão (RCEs) está cotado em apenas alguns centavos de euro e das permissões de emissão (EUAs, em inglês) caiu de cerca de € 30 em meados de 2008 para menos de €4 em 2013.

Além disso, mesmo com os compromissos assumidos na COP 18 (Doha) garantindo a existência dos mecanismos do Protocolo de Quioto, poucos países, especialmente da UE, assumiram de fato compromissos de redução de emissão – e gerarão demanda para os créditos de carbono.

Fora de Quioto, não há expectativa de novas metas de redução das emissões ou mercados de carbono antes de 2015, tornando a implementação impossível antes de 2020.

“Isso deixa um período considerável com diretrizes limitadas sobre a precificação do carbono em nível internacional”, coloca o relatório.

MDL

Para a demanda de RCEs, provenientes do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), as notícias não são muito animadoras. A publicação do Banco Mundial ressalta que várias jurisdições como o Japão e a Califórnia estão preferindo desenvolver novos esquemas bilaterais para a compensação de emissões em vez de continuar a depender dos créditos internacionais.

“Além disso, um foco cada vez maior sobre projetos de compensação doméstica é evidente em muitos esquemas, por exemplo, na Austrália e China”, completa. Mesmo em países sem um esquema de comércio de emissões, as compensações domésticas começam a ter um papel importante, por exemplo, na Costa Rica, cujos créditos darão suporte para a neutralidade em carbono.

Na China, as informações divulgadas até agora constam que será permitido o uso de CCERs (RCEs chinesas), que, segundo o relatório, poderia dar suporte à transição da estrutura de projetos de MDL no país. Com algumas exceções, o limite para o uso das CCERs nos sete esquemas piloto planejados tende a ser de 10% dos limites anuais de emissão.

No geral, análises estimam que a demanda geral por compensações de emissão entre 2013 e 2020 seja de cerca de 1,6 bilhão de CO2e – 1,4 bi vindo da UE. Porém, as projeções de oferta indicam que 1,9 bilhão de CO2e estejam disponíveis nesse período. Ambos os dados são influenciados pela evolução dos diversos esquemas ao redor do mundo, portanto, sujeitos a mudanças.

As RCEs vendidas no mercado secundário caíram de € 3,86/t em janeiro de 2012 para € 0,34 em dezembro. Sem grandes mudanças à vista, não se espera recuperação em curto prazo, o que por sua vez tem enorme impacto sobre a originação de projetos sob o MDL.

Isso fica transparente ao se analisar os números recentes. O relatório coloca que apenas 17 novos projetos foram submetidos à validação sob o MDL em fevereiro de 2013, em comparação com 256 na mesma época do ano passado.

Como o valor atual não cobre os custos de verificação e emissão de RCEs para alguns tipos de projetos, o relatório alega que o monitoramento está sendo reduzido e, em alguns casos, nos quais o projeto depende apenas dos créditos de carbono para cobrir custos operacionais, as atividades estão sendo encerradas. Assim, contratos estão sendo renegociados.

Seguindo uma tendência já observada em 2011, muitas empresas estão limitando suas atividades no MDL ou assumindo novas abordagens financeiras para os investimentos em energias limpas. O cenário do MDL parece estar assumindo uma forma completamente diferente.

Desde o final de 2012, as novas RCEs apenas serão elegíveis no EU ETS se vierem de países menos desenvolvidos ou com acordos bilaterais dentro da UE. A partir de abril deste ano também há restrição para RCEs de projetos de HFC-23 e N2O da produção de ácido adípico. Por isso a atividade de registro foi tão alta ao longo de 2012.

As transações também foram muito ativas em 2012, com 2,4 bilhões de toneladas de CO2e negociadas no mercado secundário. Porém, o montante deve retrair constantemente para menos de um bilhão de toneladas em 2015, estimam analistas.

O comitê executivo do MDL vem realizando uma série de ações buscando evitar o fracasso total do esquema, e tem focado muito na capacitação em países menos desenvolvidos. O órgão também sugeriu uma série de mudanças nas regras do MDL, que devem ser aprovadas na COP 19, em Varsóvia, no final do ano.

“Sem uma grande mudança no equilíbrio oferta/demanda, nenhuma recuperação significativa dos preços pode ser esperada no futuro próximo”, pondera o relatório.

Brasil

Em nosso país, a Política Nacional de Mudanças Climáticas (2009) inclui como uma de suas ferramentas a instituição do mercado brasileiro de reduções de emissão, porém, diferentes opções de precificação do carbono ainda estão sendo consideradas. O Brasil também faz parte da Parceria para a Preparação dos Mercados, coordenada pelo Banco Mundial.

Regionalmente, esquemas de comércio de emissões estão sendo discutidos nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, porém, têm encontrado muita oposição.

“Assim como outros grandes vendedores de RCEs, o mercado de originação de novos projetos está praticamente extinto devido às mudanças substanciais nas condições de mercado”, comentou Kossoy sobre a situação dos desenvolvedores de projetos de MDL no Brasil.

“Países como China estão apostando em um mercado doméstico e movendo-se rapidamente com a implementação de sete pilotos. Cabe ao Brasil acelerar esse processo para criar um mercado líquido que possa direcionar o redirecionamento de capitais a investimentos de baixa emissão de gases de efeito estufa”, concluiu.

Conclusões

A partir desse panorama, o relatório argumenta que este é claramente o momento de lidar com questões políticas mais amplas, como os níveis de ambição em diferentes locais e setores, e o grau em que os preços sobre o carbono nos diferentes esquemas deve convergir e se estes devem se conectar.

O Banco Mundial conclui pedindo por ações urgentes já que o “atual nível de ação nos coloca no caminho para um mundo 3,5º a 4º graus mais quente até o final do século”.

O principal desafio, adiciona, será o equilíbrio entre a gama de esquemas de precificação de carbono emergentes – que permitem avanços nas iniciativas em nível nacional – e os incentivos globais para cortar as emissões.

Fonte: http://www.institutocarbonobrasil.org.br/noticias/noticia=734244