Ruralistas veem adesão ao governo e se rebelam contra Kátia Abreu

A presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), senadora Kátia Abreu (PSD-TO), enfrenta uma rebelião no Congresso Nacional liderada por deputados e senadores da Frente Parlamentar da Agricultura, a FPA, representação que faz o lobby dos ruralistas em Brasília.

A reportagem é de Caio Junqueira e publicada pelo jornal Valor, 12-08-2013.

A queixa é quanto ao adesismo de Kátia ao governo da presidente Dilma Rousseff. O que, na visão da FPA, tem prejudicado o avanço das reivindicações do setor no Legislativo e no Executivo. Diante disso, os parlamentares passaram a buscar apoio das federações estaduais de agricultura e a pensar em montar uma chapa de oposição aKátia nas próximas eleições da CNA, em setembro de 2014.

As referências feitas ao governismo de Kátia são diversas. Algumas são consideradas simbólicas, como o fato de ela ter empregado Juliano Hoffmann, irmão da ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann. Veterinário, ele é gerente de projetos no Instituto CNA, órgão responsável por elaborar estudos e pesquisas ligados ao agronegócio. Outro exemplo, seria a distribuição de calendários da CNA, pelo país, com uma foto dela ao lado de Dilma.

A insatisfação maior, porém, é com o que os parlamentares apontam como falta de envolvimento nos principais embates do setor no Congresso. Acusam-na de ter chegado tardiamente no debate sobre o Código Florestal e de ter se afastado neste ano das discussões sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 215, que dá ao Congresso direito de definir as terras indígenas.

“Não vemos uma posição definitiva e direta dela sobre diversos assuntos. Ela faz mais um trabalho diplomático do que de enfrentamento dos problemas. Mistura a atividade política com a corporativa”, disse Valdir Colatto (PMDB-SC), integrante da FPA. “O clima entre FPA e a CNA não está bom. O pessoal sente que ela está muito governista e não participando dos embates com a gente. Ela poderia ser mais presente, até pelo prestígio que tem com a presidente”, disse Moreira Mendes (PSD-RO), que já presidiu a FPA.

O tensionamento chegou a tal ponto que algumas pequenas retaliações começam a ocorrer. No Senado, Blairo Maggi (PR-MT) apresentou uma PEC que, na prática, acaba com a contribuição sindical compulsória, que sustenta todo o sistema CNA. Na Câmara, a Comissão de Agricultura aprovou uma Proposta de Fiscalização e Controle para investigar o repasse de verba federal ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural do Estado de Rondônia e à Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Rondônia, comandada por um aliado de Kátia.

Alguns parlamentares já comentam a possibilidade de a FPA se articular com federações estaduais contrárias aKátia para lançar uma candidatura contra ela na eleição da CNA, prevista para setembro de 2014. “Quando há um desconforto, sempre há possibilidade de uma alternativa”, disse Colatto.

O colégio eleitoral da CNA é composto pelos presidentes das 26 federações de agricultura estaduais mais a do Distrito Federal. Kátia tem domínio quase pleno sobre as federações das regiões Norte e Nordeste, com base, segundo fontes, em empréstimos aprovados pela diretoria da CNA. Os focos de maior rejeição se concentram no Distrito Federal, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo e, em menor grau, no Mato Grosso e Rio Grande do Sul. Mas é difícil achar algum dirigente que critique abertamente a senadora.

Um episódio recente ajudou a acirrar os ânimos. No dia 14 de junho, os produtores rurais, estimulados pelas federações e pela FPA, decidiram fazer uma paralisação nacional no país para chamar a atenção para o conflito aberto que têm com os índios e a Funai, responsável pela demarcação de terras indígenas. A ideia era interditar as rodovias, mas a CNA defendeu manifestações à margem das rodovias, sem interdição, conforme defendia o Palácio do Planalto.

É nesse conflito entre a atividade política e a corporativa que reside a maior parte das críticas à senadora, que entra agora na reta final para decidir se deixa ou não seu partido rumo ao PMDB. A migração ganhou força após as manifestações de junho e a retomada da possibilidade de o PSD não apoiar a reeleição de Dilma em 2014. A cúpula do PMDB considera haver chances reais de atraí-la. Para tanto, falta uma costura com o PMDB de Tocantins, onde o ex-governador Marcelo Miranda tem interesse em disputar o governo, mas possui problemas na Justiça. Kátia seria candidata a governadora ou à reeleição no Senado.

Na FPA, há quem veja a ligação dela com a presidente como um ativo em potencial para beneficiar o setor – contanto que os ajustes sejam feitos. É com esse objetivo que nos próximos dias parlamentares tentarão reaproximar as duas entidades. Há uma avaliação de que um núcleo duro na FPA é mais radical e ativo, mas não necessariamente representa o pensamento da totalidade de seus 214 deputados e 14 senadores. Nesse sentido, atribuem o embate muito mais ao fato de Kátia estar próxima a uma presidente do PT do que sua atuação em si na CNA.

Também há a avaliação de que o setor, em conflito interno, tem como maior prejudicado o próprio setor. “Não é o momento de nos dividirmos. O jogo não é esse. É burrice esse enfrentamento. Críticas podem existir, mas devem permanecer interna corporis”, disse o líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado. O presidente em exercício da FPA,Luis Carlos Heinze (PP-RS), vai no mesmo sentido. “Temos que alinhar algumas ações, sim, mas não entrar em disputa. A FPA tem que agregar as instituições, não dividir. Temos que juntar nossas forças. Nossa bandeira é a agricultura.” Procurada, a senadora Kátia Abreu não quis falar com o Valor.

Fonte: IHU